sexta-feira, agosto 04, 2006

Concepção Mutante

Dia 24 de julho, Os Mutantes aportaram na lendária casa de shows The Fillmore, em San Francisco, California. Nem a monótona banda de abertura, o Brightblack Morning Light, uma espécie de aprendiz meia-sola da banda principal, impediu que a apresentação dos Mutantes entrasse para meu ranking pessoal dos melhores shows já vistos. Sim, a noite foi mágica. E era tudo verdade! Estavam no palco Sergio Dias, Arnaldo Baptista, Zelia Duncan e banda, que incluía também o clássico baterista Dinho. Sob uma luz teatral, "Dom Quixote" colocou o público em estado de choque, adestrando os menos crédulos, o que seria a noite. Antes da segunda música, "Caminhante Noturno", ao tocar a corneta improvisada da introdução, a clássica guitarra 1966 (custom made) de Dias vai ao chão por acidente. Mil e quinhentas pessoas gelam de compaixão ao ver a cena. Eram na sua grande maioria non-Brazilian. O assistente de palco ameaça trazer um instrumento substituto. Ele não quer. Calmamente ajoelha-se ao silêncio daquela imensidão apática e afina a guitarra. Exatos 120 segundos depois, brinca: "Ela aguenta!". O povo aplaude. Sergio Dias mostra-se o que podemos comparar com um vinho resultado do melhor amadurecimento. Cantou, tocou, solou como nunca se vira antes. Dedicou "El Justiciero" a Mr.Rumsfeld, Bush, Condoleeza e toda a trupe. Foi aplaudido de novo. Não faltaram os hits internacionais da banda "Baby", "Top Top", "Balada do Louco", "Minha Menina", "Ando Meio Desligado", "Virginia" e "Tecnicolor", essas últimas três na versão da língua local. Arnaldo Baptista provou em "Dia 36", a tal recuperação plena de seus reflexos nos teclados e voz que preocupavam tanta gente.

E a Zelia, hein? Blá, blá, blás a parte, aquele papo de "queria que fosse a Rita" caiu por terra. A verdade é que Ms. Duncan completou com maestria a missão a que lhe foi destinada. Ninguém sentiu falta do que não viu. Aliás, eu também gostaria de dar o meu pitaco sobre aquele papo "dos velhinhos geriátricos": Janis Joplin tocou no The Fillmore. The Doors, Greatful Dead, Bob Dylan, Neil Young e centenas de outras bandas que fizeram E FAZEM a história da boa música também tocaram. Estar naquele templo sonoro, vendo uma banda estrangeira com sua capacidade sold out , deve significar alguma coisa mais que simplesmente arrecadar dinheiro para pagar contas de asilo. Os Mutantes tocaram no The Fillmore. Tenho certeza que os desviados de carreira solo não. Existe a polêmica de quando uma banda deve acabar. Mas há de se entender quando uma banda PRECISA voltar. Enfim...

Antes do bis, "Bat Macumba" e "Panis Et Circenses", todos já guardariam essa noite para sempre com carinho especial. Voltaram só para ratificar... Só fica um sentimento de frustação no ar: corria na boca miúda que até a banda sair do Brasil rumo a Europa e USA para turnê, ainda não havia sido convidada a tocar no Brasil. Como assim? Acho que está na hora de desempoeirar o armário e prestar atenção no ouro que se tem em casa. Os gringos já compraram. Acorda Brasil! Os Mutantes estão de volta. Os Mutantes são o cara. Ainda.

Fotos: Luiza Leite